sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Wake up

Sabe esses testes bobos de internet, tipo "qual música do Beatles você é" (eu era Ob-la-di, ob-la-da), que tanto bombaram no início do século? Então, eu adorava, fazia todos que passavam pela minha frente. E, claro, depois colocava o resultado no blog da ocasião. Se não me falha a memória, este é o meu quarto de 2001 para cá, o segundo no blogspot. Tive um na versão brasileira do Blogger e outro no zip.net.

Enfim, esse pequeno nariz de cera só para dizer que eu fiz mais um, não resisti ao saudosismo. O mais engraçado é que ele veio no Facebook. É, eu também estou nessa rede social (assim como no Orkut, no Plurk, no Flickr, no Fotolog, no My Space, no Multiply e até no LastFM). Yeah, I'm a big fat nerd. Voltando ao que interessa, esse teste veio em espanhol, foi a Cris que mandou. E a pergunta era interessante: que tipo de banda indie eu sou?

Respondi as perguntas com seriedade, apesar de não entender muito o espanhol colocado nas perguntas e nas opções. Até que gostei do resultado: eu sou o Arcade Fire! A primeira coisa que eu fiz foi pegar o primeiro disco da banda, Funeral, e colocar para tocar no som. Já é mais de duas da manhã e eu deveria estar dormindo há um tempo, mas o calor brasiliense não deixa.

Nisso, foi inevitável lembrar do TIM Festival de 2005. Até hoje, o melhor festival que eu fui. Aquele ano teve um componente muito especial: duas das minhas bandas prediletas da safra 2000 - Strokes e Kings of Leon, nessa ordem - iam tocar na minha frente. Mas antes de chegar neles, eu tinha que passar por Mundo Livre, MIA e Arcade Fire. Tem um texto sobre o fim de semana em questão no meu antigo blog. É só clicar aqui.

Como sempre, eu estava em São Paulo para assistir o festival. Comigo a trupe de ufsquianos que tomou de assalto o mercado jornalístico paulistano. Todos esperavam o Strokes, tinham uma certa expectativa pelo Kings of Leon e acabava aí. Depois de Mundo Livre e MIA, todos nós fomos surpreendidos por oito loucos no palco, se revezando nos instrumentos e correndo, pulando, subindo, descendo de qualquer lugar disponível.

Eu sou chato para shows. Tenho a tendência de não gostar quando não conheço muito. Ou então não fazer questão de acompanhar. Esse dia foi diferente. Eu conhecia apenas uma música do Arcade Fire, Wake up. Foi com ela que os canadenses abriram a participação no TIM de São Paulo. Lembro bem das impressões que a banda me causou: espanto, assombro, curiosidade, êxtase. É, e isso tudo apenas em uma hora e conhecendo uma única canção...

Claro que quando voltei a Brasília minha primeira providência foi comprar o "Funeral". Mas, por mais que eu tenha boas lembranças desse dia e goste do disco, não me conformo com a descrição que o teste me deu: "Usted es una persona muy vulnerable. Sus estados de ánimo suelen variar desde lo más depresivo a una felicidad incomparable. La muerte le es cercana, pero no le teme. Le gusta el drama, le preocupan los problemas sociales y hay veces en que lo mejor es estar solo. 'Despierta'."

Metade verdade, metade falso. Às vezes eu penso ser feito de gelo de tanto que chamam de blasé. Então não confere o transtorno bipolar (hahaha). Que eu não temo a morte, isso é verdadeiro. Assim como sou até um pouco insensível quando ela acontece por perto. Drama? Não, odeio fazer e presenciar drama, tenho ojeriza momentânea de quem faz. Ah, deixa pra lá.

Tudo isso para dizer que eu lembrei do show fantástico do Arcade Fire em 2005, um dos melhores que eu fui na vida, por causa de um teste besta de internet. Como viaja o pensamento, caramba...

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Série A de Avaí

Eu ia escrever alguma coisa sobre o jogo do Avaí de ontem. Sim, sou fanático torcedor do Leão da Ilha de Santa Catarina. Mas, ao ler o Diário Catarinense de hoje, senti-me representado pelo magnífico texto do Sérgio da Costa Ramos. Pela segunda vez, chorei ao lembrar do gol do Evando e de toda a magnífica campanha na Série B do Brasileirão deste ano.

Aqui vai a íntegra:

Especial
Série A é "Coisa Feita", por Sérgio da Costa Ramos

O azul é a mais profunda das cores. Nele, o olhar mergulha sem encontrar qualquer resistência, perdendo-se até o infinito. O azul é o mais natural dos matizes, pois a cor nada mais é do que o reflexo do céu. O azul não é deste mundo. Sugere uma idéia de eternidade tranqüila e altaneira, que é "sobrenatural". O azul é a proximidade com Deus. Ou seja: O Senhor agora está bem representado na Série A.

No pico da Ilha Formosa

O ponto culminante do Brasil não é o Pico da Bandeira, em Roraima. Depois que a bandeira do Avaí foi içada nos altos do Morro da Lagoa da Conceição, ontem à noite, assim que o fuzileiro Evando despachou o Brasiliense, o novo cume de uma montanha brasileira passou a ser o Morro do Padre Doutor, a 450 metros de altura - no entorno do mais conhecido umbigo da Ilha - Avaiana.

Não há artigo mais procurado na praça. A bandeira do Avaí passou a ser um símbolo de vitória muito mais expressivo do que a própria "Stars and Strips Forever", fincada em 1945 num morro da árida ilha de Iwo Jima, ao sul do arquipélago japonês, no momento mais fotografado da Segunda Guerra Mundial.

Não se encontra mais em loja alguma esse véu azul e branco, amuleto da gloriosa epopéia da Batalha da Série A, ontem vencida, crismada e coroada pelos fuzileiros avaianos.

A mais bela conquista dos 85 anos do Avaí começou com uma derrota.

Em seis minutos, uma vitória por 2 a 1, que daria ao clube o título do primeiro turno do Estadual de 2008, transformou-se numa constrangedora derrota por 3 a 2, consumada pela Chapecoense, nesta mesma Ressacada que ontem se cobriu de glórias.

O primeiro sinal de que o ano seria diferente veio da torre de comando. O general João Nilson Zunino e seu Estado Maior, inconformados, saíram a campo em busca do comandante ideal - um homem que devolvesse o "panache" ao esquadrão de Adolfinho, Saul e Nizeta.O escolhido foi Silas Pereira e o eleito foi o Avaí. O ex-craque do São Paulo e da Seleção Brasileira entrou em campo para iluminar o caminho rumo à Série A - com poucas, porém certeiras contratações. E o estandarte azurra nunca mais conheceu o pó da derrota, pelo menos nas terras santas da Ressacada.

Ao final do segundo turno do Catarinense, o Avaí já era o melhor time de Santa Catarina e um dos melhores do sul do Brasil. Circunstância ignorada apenas pelos "encantadores" de arbitragens, Napoleões da esperteza que, cedo ou tarde, conheceriam o seu Waterloo.

Invicto, o Avaí foi "retirado" do campeonato, depois da sonegação de três pênaltis numa só partida. Pensando mais alto, sequer registrou o B.O. do furto qualificado.Jours de GloireNuvens mais altaneiras o esperavam. Uma campanha invicta até a nona rodada da Série B, revelava, ao cabo do primeiro turno, um competidor de elevado poder de fogo, a segunda força do campeonato, comparável apenas ao multimilionário projeto do Corinthians paulista.

Bem no meio da disputa, os obuses do inimigo abriram uma clareira nas formações azurras. Os inimigos comemoraram as "baixas".

O "mercado" e as chuteiras dos adversários desfizeram a dupla de ataque que disparava as granadas, em direção ao topo. Vandinho foi parar no Flamengo e Abuda na enfermaria.

Foi quando luziu a inspiração do Estado Maior azul. Uma nova dupla foi formada, com o poder de fogo de um general Patton, aliado ao general Zukov. Evando e William chegaram para restabelecer a pontaria, a partir da 17ª rodada. Então, "coisas inéditas", coisas que só o Avaí sabe fazer, começaram a se desatar no palco quase sempre encharcado da Ressacada. Com Eduardo Martini, Marquinhos, Evando & Cia, entraram em campo o Senhor dos Passos e Cruz e Sousa - avaianos de longa data, aliás, avaianos de "sempre".

O negro simbolista trouxe o "Vento Sul" - veterano artilheiro azurra - para tabelar com Evando e até com o goleiro Martini - autor de um gol eólico no jogo contra o Paraná, abertura do returno.

Era apenas a primeira de uma coleção de mágicas: elas foram inauguradas com o gol de bicicleta contra o Corinthians e o "lençol anfíbio" contra o Bahia - obras de Evando e Marquinhos. Mais o passe "Fui-Mas-Não-Fui", contra o Marília, abracadabra com a qual Evando colocou William na chamada "cara do gol".

Glória com chuva

Houve um momento que, aos adversários, juntou-se o mau tempo - e o Avaí teve que justificar o seu berço de luta. De haver nascido com o nome de uma batalha "dentro dágua". Contra o Paraná, Fortaleza, Bahia, Criciúma e Marília, o campo se transformou num brejo e o time foi obrigado a jogar pólo-submarino: venceu todas as partidas, com a garra e a mística do "Faz-Coisa".

Quando os próprios avaianos não sabem explicar as razões de sua glória, dentre tantas as que foram consagradas ao azurra, apelam para o velho misticismo de que "esse Avaí faz coisa".

Viver o sonho da Série A é um prematuro presente de Natal para avaianos "galáticos", como Saulzinho, Nizeta e Tullo Cavalazzi, irmão de outro inesquecível Cavalazzi, o endiabrado "Bitanha".

É uma homenagem a Zenon e sua refinada técnica. É uma lembrança do estilista Veneza, maior zagueiro que já vi jogar. É um cumprimento aos bravos Toninho e Juti, e, mais recentemente, um aceno ao craque Adilson Heleno.

É um agradecimento a Guga Kuerten, craque de outra bolinha, que, coroado Rei de Roland Garros, declarou à imprensa universal, olhos injetados de puro amor ao azul:

- Sou Avaí e o meu ídolo é o Jacaré!

Perfilou-se, então, para ouvir em pleno Bois-de-Bologne a "Marselhesa" dos hinos de clubes brasileiros - sim, em francês! Obra dos avaianos Fernando Bastos e Luiz Henrique Rosa, versão inspirada de José Bastos, em seu momento "Charles Aznavour":

À lîle charmante/Pleine de Grace/Léquipe pugnace/Ce peuple ces gens,/Emotion enrichie/Il n y a qun coeur /De mon Avai...
Avai, mon Avai
À lÎle tu es le Lion
Avai, mon Avai
Tu es déjà né champion...

É impossível contabilizar méritos neste momento de consagração. Mas há gerações de figuras alpinas neste Avaí guindado à Série A, depois de 85 anos. Há velhos Himalaias, como Amadeu Horn e Arnaldo Pinto de Oliveira, fundadores. Há Everests como Aderbal Ramos da Silva, Saul Oliveira, José Amorim e João Salum. Há a generosa entrega cardiovascular do sangue azul que habita as artérias dos irmãos Bastos, José e Fernando - a este creditado, sobretudo, a Marselhesa que enaltece o "Leão da Ilha Formosa". Há a devoção e a entrega de Flávio Félix, Campeão Brasileiro da Série C - um homem de estrela.

E há este incansável herói do presente, o presidente João Nilson Zunino, que contra todos os incréus, acaba de levar o Avaí à sua maior conquista e aos seus "jours de gloire": o acesso à Série A do futebol brasileiro.Recuso-me a continuar escrevendo. Vou me incorporar à próxima carreata - foguete no ar, bandeira na mão, o Avaí no coração.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Brincando mais uma vez de Nick Hornby

Ao responder a um desafio no Plurk - boa parte da minha ausência aqui no blog é por causa dele -, comecei a matutar e demorei para encontrar resposta. A pergunta era singela: diga uma música linda. Só isso. O problema é que o parâmetro é grande, amplo demais. Você pode considerar uma música bonita porque a melodia te faz sonhar, ou porque a letra tem uma poesia fora do comum, ou porque fala de amor e por aí vai... Depois de dar uma boa matutada nisso, coloquei lá duas músicas. E como em São Paulo eu peguei a edição gringa de Alta fidelidade do Dilson para ler, decidi fazer um top 5 aqui. Assim como os maiores foras que Rob Flemming levou, eu vou fazer esse em ordem cronológica.

1- Johnny Cash - I walk the line
Single (1956)
Johnny Cash era, acima de tudo, um malaco. O homem de preto escrevia sobre cadeia, sobre brigas e sobre assuntos mais soturnos. Mas também sabia, como poucos na época, compor músicas que tocassem as pessoas pela simplicidade da melodia e pela letra direta, apaixonada e sem rodeios. Ouvir I walk the line é deixar entrar no sistema uma canção onde ele diz que, por causa da amada, consegue ser uma pessoa melhor. Mesmo que, quando o dia acabe, ele fique sozinho, mas a lembrança da amada o faz voltar para a linha. Não consigo imaginar um melhor elogio do que ouvir que, por causa de mim, você quer ser uma pessoa melhor. Aí eu lembro daquele diálogo entre Jack Nicholson e Helen Hunt em Melhor impossível. Ela pede um elogio e ele responde: "Você me faz querer ser um homem melhor". Uau.
Por que é linda? Porque ela me faz querer ter alguém para ser uma pessoa melhor.

2- Rolling Stones - Far away eyes
Disco: "Some girls" (1978)
Sim, eu sou fã dos Stones. Sinceramente, não sei como tem gente que curte rock e renega a banda. Talvez seja o efeito da vitalidade e dos péssimos discos lançados desde a década de 1980. Eu, por muito tempo, delimitei uma faixa temporal, que começava em 1966 ("Aftermath") e terminava em 1974 ("It's only rock'n'roll"). Isso durou até uns meses atrás, quando eu finalmente assisti Shine a light, o celebrado - e superestimado - documentário da banda assinado por Martin Scorsese. Lá no meio, Keith Richards deixa a guitarra de lado e assume o vocal. Começa então um country arrastado, bem lento, com steel guitar e tudo mais. Arrepios. Aí eu fui atrás de "Some girls" e estiquei a faixa até 1978, muito por causa dessa música. Jagger canta como se estivesse no Tennessee, forçando o sotaque red neck e a entonação. Tudo que ele quer é uma garota com olhos distantes, que vai consertar sua vida quando a maré de azar chegar e a sua vida não valer um centavo. A vida é uma merda, mas uma mulher assim pode melhorar tudo. E não é verdade?
Por que é linda? Porque dá esperança; afinal, é preciso achar uma garota que te coloque para cima. E a música remete a um dia feliz, dançando juntinho com a menina em um bar os velhos refrões que um velho ensinou.

3- Neil Young - Harvest moon
Disco: "Harvest moon" (1992)
São tantas lembranças que fica impossível não colocar Harvest moon nessa lista. Esse foi o primeiro disco do Neil Young que eu comprei, e até hoje o considero o melhor da minha (pequena) discografia do cara. Ele tem a manha de fazer álbuns de rock sujos, com uma pitada de country, e, de repente, lançar composições compostas em violão, em um clima acústico e sobre temas rurais, perfeito para ouvir com aquela garota ao lado. Obviamente o ponto alto é a música no meio das faixas 3 e 5. A levada de vassoura na bateria dita o ritmo, enquanto a guitarra dedilha as notas mais altas. E a letra não deixa barato. Realmente dá vontade de fazer o que ele diz. Pegar a amada, andar de mãos dadas e dançar um pouco somente com a luz da lua. Sentir a noite como se não houvesse mais nada além disso. Ah, e o maior prazer de todos é vê-la dançar.
Por que é linda? "I want to see you dance again / because I'm still in love with you / on this harvest moon", canta Young. Isso não é só amor; é admiração e idolatria também, na medida certa. Precisa mais?

4- Los Hermanos - Sentimental
Disco: "Bloco do eu sozinho" (2000)
Sempre que ouço esse disco, lembro do que o Upiara escreveu em uma edição do finado e-zine Cabron, que enviávamos por e-mail para umas centenas de pessoas uma ou outra vez por mês há uns seis ou sete anos. "Como sofre de amor esse tal de Los Hermanos!", sustentou Upiara no fim da resenha do "Bloco do eu sozinho". Não que a banda dos hits Anna Júlia e Primavera não fosse assim antes. Só que no primeiro disco tudo acabava disfarçado pelo estilo hardcore que a banda tentava adotar. Depois mudou, como mostra essa música. Sentimental sobe lentamente. Primeiro entra o piano, seguido da bateria e do dedilhar da guitarra. Vai assim até chegar na estrofe esgoelada, ferida e desesperada gritada por Rodrigo Amarante. Não tem esperança, não tem final feliz, não tem redenção. O amor também pode ser uma merda; basta não ser correspondido para saber como é.
Por que é linda? Porque é o perfeito caso onde letra e melodia se encontram. Ambas são melancólicas ao extremo - dá vontade de chorar ouvindo a agonia do Amarante -, mas conseguem escapar do pieguismo e de qualquer excesso.

5- Radiohead - House of cards
Disco: "In rainbows" (2007)
Rob Flemming perguntava se as pessoas eram miseráveis porque ouviam música pop ou se era o contrário. Aqui é mais um caso de uma música que trata de um amor não correspondido, de desilução. Mas o freak Thom York tem um jeito especial de transformar a saga de um cara apaixonado por uma mulher casada num libelo a favor da felicidade a partir de decisões extremas. O rapaz já chega dizendo que não quer amizade, quer um relacionamento amoroso. Não negue, beije seu marido e vá embora depois de jogar as chaves do pote. É como se York dissesse para as pessoas terem coragem de assumir o amor, mesmo que isso seja muito duro de fazer. Ela está no outro lado de Sentimental. Enquanto o Amarante se lamentava por ela não corresponder, aqui o Radiohead coloca o pé na porta e grita "denial, denial".
Por que é linda? Porque resgata a atmosfera perdida com o lançamento de "Kid A". E porque, desta vez, York foi direto ao ponto, sem precisar de árvores de plástico ou de lutar contra o carma da polícia.